Efeminofobia: Um estudo acadêmico sobre o preconceito contra gays afeminados em aplicativos de relacionamento

 

Captura de tela de perfil no aplicativo Grindr.
(Perfil no Grindr com rejeição a afeminados. Foto: Lucas Feitoza/ Aquenda Notícias)


 Aplicativos de relacionamento são fortes aliados de LGBTs para se relacionarem. Além de poderem conhecer pessoas de outros lugares com interesses em comum, as ferramentas permitem que os usuários conversem em segurança, porque na rua podem se tornar vítimas de homofobia. Entretanto, na procura por parceiros, os critérios excluem os corpos mais presentes na comunidade: gays afeminados.

A efeminobia, é o termo usado para o preconceito com gays afeminados ou que não se enquadram nos padrões de masculinidade predominantes. Quem chama a atenção para o assunto nos aplicativos de relacionamento é Mahmoud Baydoun, mestre em psicologia pela Universidade Federal de Rondônia – (UNIR). Em sua dissertação: Não sou nem curto afeminados- Reflexões viadas sobre a masculinidade hegemônica e a efeminofobia no Grindr  relata que despertou o interesse na temática pelas experiências vividas por ele, rodeados de questionamentos no aplicativo, relacionadas a sua discrição, além de frases mostrando a aversão aos homossexuais vistos como femininos. Também pela sua própria atitude, ao perceber que se sentia muito mais atraído por padrões de masculinidade.

Baydoun não culpa os efeminofóbicos pelas ações, coloca-os na posição de vítimas juntos dos efeminados.

“Acredito que tanto os efeminados quanto os detentores de discursos efeminofóbicos são simultaneamente vítimas das normas ditadas pela masculinidade hegemônica e pela matriz heterossexual” (BAYDOUN, 2017, p. 9-10).

Para auxiliar o desenvolvimento do seu argumento, Baydoun usa textos de outros autores acerca de temas relacionados, Richard Miskolci, sociólogo que escreveu o livro Teoria Queer:  Um aprendizado pelas diferenças (2012), foi um dos pensadores citados pelo psicólogo. Assim como fez Miskolci ao usar “queer” para causar incômodo em quem lesse, Baydoun usou “viadas” para ter o mesmo efeito, essa inspiração foi explicada pelo autor na introdução da tese:

“Denominados de estudos viados/teoria viada para que gere nos leitores o mesmo desconforto/estranhamento que a expressão queer causa nas pessoas de países anglo-saxões. “(BAYDOUN, 2017, p. 10). 

O psicólogo analisa que com o objetivo de manter os interesses homoafetivos em sigilo para respeitar aas condutas heterossexuais, muitos usuários preferem os padrões masculinos, por isso são disseminados os discursos contaminados pela efeminofobia e o culto a um perfil específico de parceiro.

Em sua pesquisa no Grindr, aplicativo de relacionamento gay, Baydoun destaca que ele possui categorias de tribos que podem ser selecionadas pelo usuário, ressalta ainda que estas categorias se relacionam as usadas pela indústria pornográfica. No útimo dia 14 de novembro, Mahmoud Baydoun publicou o livro Não sou nem curto afeminados baseado na sua tese.

(Mahmoud Baydoun e  seu livro Não sou nem curto afeminados. Foto: Mahmoud Baydoun/ reprodução)


Conversamos com usuários de aplicativos para saber o ponto de vista deles sobre o assunto:

Átila Guimarães, 34, assistente social, é usuário de aplicativo de relacionamento e nos conta que não se incomoda com os comentários que vê.

Eu não me sinto mal, mas creio que seja pelo entendimento que tenho em relação a questões de gênero e sexualidade. Entendo como uma questão macro. Que pessoas assim tem um porquê histórico e societário para serem assim. Como eu não vou alcançar isso, nem mesmo conseguir mudar a pessoa, eu levo para essa maneira, fica mais fácil para mim. 
  

Átila acredita que o conhecimento é a forma de mudar o preconceito:

Acho que a maior forma de combate para qualquer tipo de preconceito é mesmo o conhecimento, isso de uma forma geral. como vivemos ‘num’ país onde a educação não é valorizada, se torna difícil potencializar as vítimas através do conhecimento. acho que esse é o grande "problema".

 

Ricardo (nome fictício),24, operador de vendas, relatou um caso vivido por ele:

Tudo começou no aplicativo, conversei com a pessoa durante dias. Chegamos a trocar redes sociais coisa que não faço geralmente com qualquer pessoa. Até aí ‘tava’ tudo bem ‘né’? Até que eu passei meu Instagram. Bom, após a pessoa ver algumas fotos onde eu parecia meio pintosa (risos). A pessoa simplesmente surtou, printou uma das fotos das quais não estava satisfeito. Do nada começou a me xingar "bixinha, viadinho, frutinha", vários adjetivos. Falou do meu corpo que eu era muito magro e nunca iria ter alguém que gostasse de mim, e que ninguém um dia iria me assumir. E eu só fui entender que o cara estava me xingando porque só havia percebido que eu era afeminado depois de uma foto no Instagram. E foi uma coisa que me irritou no grau de eu chegar até a me questionar por um tempo, se eu deveria continuar assim ou não. Mas percebi que no final de tudo, não tenho que agradar ninguém, acho que cada um tem que gostar do jeito que você é. E se ele não teve interesse outras pessoas terão.

Os dois entrevistados disseram nunca terem ouvido falar no termo efeminofobia.

O preconceito com gays afeminados é um assunto pouco debatido na grande mídia, enquanto existe um vasto material acadêmico a respeito desse e de outros assuntos relacionados, poucas matérias são produzidas dando destaque a esta forma de discriminação. Será que tornar acessível e simplificar a linguagem do material acadêmico em textos jornalísticos fariam estes assuntos serem mais debatidos?

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